“Um dia quase que saíste do meu coração…”
” Traías-me, traíste-me inúmeras vezes e nunca chegavas a tocar a fímbria da traição.
Diziam que eu te perdoava tudo.
Como se iludiam.
Nunca tive nada para te perdoar, vejo-o agora, com uma nitidez impossível. Gostavas dessa forma de intimidade rápida que é a discórdia.
E eu também. Éramos imperdoáveis, seremos imperdoáveis um do outro, cascos naufragados no negro incêndio do mar. ”
“Prefiro esquecer, esquecer-te até se preciso for, para viver como tu vivias, apreciando cada momento – sobretudo os dolorosos, pela lucidez que trazem como bónus – desta tão precária maravilha a que chamamos existência. Tantas vezes te aconselhei as virtudes do silêncio. Queria calar-te para te proteger.
Há poucas pessoas apetrechadas para a verdade – mesmo nós, quantas vezes não fechámos à chave umas verdadezitas mais cortabtes para não nos magoarmos?
Creio que me fazes – schiuuu! – assim, com um vagar de embalo, sempre que a voz da minha consciência (seja lá isso o que for) sobe o tom para me acusar pelo que não te dei. Creio sem crer, como um condenado.
Afinal de contas, não tenho nada a perder.
Mesmo que os anjos não existam, as asas com que te vejo, sentada na beira da minha cama, do cume enlouquecendo da minha insónia, ficam-te melhor do que todas as toilettes. Esforço a imaginação, estendo-a até aos teus dedos, mas não consigo mais do que um ligeiro raçagar de asas.
São lençóis que agito, bem sei – mas não me concederás a graça de transformar a fímbria do meu lençol na ponta dos teus dedos?”
Livro : “Fazes-me falta” – Inês Pedrosa
“Fiquei em ti mas deixaste de precisar de mim, e por isso precisei ainda mais de ti.”
…
“Estou à tua espera num sítio onde as palavras já não magoam, não ferem, não sobram nem faltam. Esse sítio existe.”
Inês Pedrosa (Fazes-me Falta)